No maior evento de tecnologia do mundo, web3, cripto e inovação para o bem foram os destaques
No início de novembro, Lisboa recebeu mais de 70 mil pessoas para o maior festival de tecnologia e inovação do mundo: o Web Summit. Fomos até lá conferir o que o futuro nos reserva e voltamos para as terras brasileiras com mais perguntas do que respostas — o que é ótimo!
Com pessoas do mundo todo, o evento é bastante caótico. Mas o caos, aqui, tem duplo sentido: como uma mistura de pessoas vindas de todos os lugares, de idades e pontos de vista diferentes. Uma bagunça que se auto-organiza. Foram muitas ideias juntas, muitas vezes até conflitantes entre si, principalmente em relação a temas que ainda estão sendo conceituados, como foi o caso da trilha de conhecimento sobre Web3.
Mas é do caos que surgem as grandes ideias. E toda essa efervescência de conhecimento, com questionamentos e ponderações, fez do evento um grande palco para conectar saberes e exercitar o olhar para o futuro de um jeito único.
Confira abaixo um resumo dos principais pontos que acompanhamos em Lisboa. Quer acessar esse conteúdo em profundidade, com desdobramentos sobre temas específicos? É só entrar para a nossa comunidade — é gratuito!
Para começar, algumas perguntas-chave
Por aqui, a inundação de conteúdo e ideias do evento nos provocou a elencar as questões principais:
- Como a tecnologia pode tornar a sociedade melhor?
- Como a tecnologia pode ser usada para o bem e não para o mal?
- Como desenvolver experiências que realmente agreguem valor no metaverso?
- Como projetar uma monetização menos tóxica no metaverso, em comparação com a web 2.0?
- Realmente podemos acreditar em web3 ou isso é bulshitagem?
- Como confiar na web3, em seus players e no seu cenário especulativo e não regulado?
- O metaverso mal nasceu e já morreu? Ele será de alguém? Quem lidera a corrida?
- Como serão nossas identidades no metaverso?
Tecnologia para o bem
Já na cerimônia de abertura do Web Summit, as questões éticas da tecnologia ficaram em destaque. Como convidada surpresa da edição, a primeira-dama da Ucrânia, Olena Zelenska, fez um apelo emocionante: que a tecnologia seja usada para ajudar as pessoas, não para destruí-las.
“A tecnologia deve trabalhar a favor da humanidade, e não contra ela.”
Zelenska focou sua fala na força da tecnologia, que pode ser usada para construir ou destruir, mostrando imagens de drones russos atacando cidades ucranianas, mas também de próteses de última geração que têm ajudado na recuperação de soldados feridos em combate.
Metaverso, criptoativos e Web3
As apostas para o Metaverso e para a nova onda da internet — a web3 — foram, com certeza, o tema mais discutido entre os palcos do Web Summit. E nestas trilhas de conhecimento, muitas ideias diversas e até conflitantes entre si tornaram a discussão ainda mais interessante.
Ainda no primeiro dia de painéis, o CEO da Improbable, Herman Narula, falou sobre a sua desconfiança prévia acerca de uma internet baseada em tokens e criptoativos, mas explicou que não vê outro modelo que comporte economicamente o desenvolvimento do metaverso. “O metaverso é uma rede de experiências interligadas, muitas das quais não podem viver por si. A Web3, a curto-prazo, é a única coisa que oferece soluções plausíveis para se conseguir gerir a economia do metaverso”, explicou o empresário da tecnologia, usando como argumento a descentralização que esse modelo propõe. Para ele, o caminho é ter um metaverso regulado pelas pessoas, e não por uma empresa — uma cutucada clara para a empresa de Mark Zuckerberg.
Outro nome aguardado para falar de metaverso foi Naomi Gleit, Chefe de Produto da Meta — big tech que naquele momento, ao mesmo tempo em que anunciava investimentos anuais de US$ 1 bilhão no metaverso, demitia 11 mil pessoas. Em sua fala, Gleit tocou em assuntos como um possível monopólio por parte da corporação e afirmou que isso não vai acontecer, uma vez que outras empresas da área também têm feito investimentos altos na área. Segundo a executiva, esse esforço é uma aposta que irá compensar na medida em que a tecnologia se tornar mais imersiva.
Em um link com o modelo de negócio do Meta, o fundador da Second Life, Philipe Rosedale, explicou que o grande problema da corporação liderada por Zuckerberg é pensar um metaverso como plataforma de anúncios, como já faz com as redes sociais. Para ele, é um erro pensar a experiência do usuário a partir da mediação de um anunciante que busca informações sobre quem é o usuário, para fazê-lo consumir. Para que o metaverso se torne sustentável, seria necessário pensar em novas formas de monetização, mais saudáveis, acredita Rosedale.
“A web3 não é a web”
Um dos painéis mais comentados sobre os caminhos da internet foi de Tim Berners-Lee, o criador da World Wide Web. Em sua fala, o físico argumentou que não é contra a web3, mas acredita que existem caminhos mais interessantes para o futuro da internet que não passam pela tecnologia blockchain – segundo ele, cara e complexa demais.
Lee também apresentou seu novo projeto, o Solid: em vez de ter seus dados pessoais espalhados por toda a web e armazenados por terceiros, o sistema possibilita que essas informações estejam em um único lugar e sob controle do próprio usuário. Esse lugar é chamado de Pod, uma abreviação de Personal Online Data Store, que permite ao usuário conceder e revogar o acesso às informações armazenadas, sempre que quiser.
NFT é só um JPG superfaturado?
O painel de Nicole Muniz, CEO da Yuga Labs, começou focado na apresentação do Otherside, metaverso proprietário da empresa que criou as famosas coleções de NFTs do Bored Ape Yatch Club. Mas não demorou muito para que Muniz respondesse a pergunta frequente, que compara os tokens não fungíveis com imagens digitais já conhecidas.
Para a executiva, a principal diferença está no direito de posse. “Tudo o que fazemos é baseado em propriedade. Se você possui algo, como uma camiseta, pode fazer o que quiser com ela. Temos uma visão de futuro em que pessoas vão ter esses ativos para utilizar da forma como bem entenderem, principalmente os monetizando”, explicou.
Creator Economy
Para os criadores de conteúdo, as comunidades são a aposta da vez. E quem falou sobre isso no Web Summit foi a CEO do OnlyFans, Amrapali Gan, que compartilhou números bastante atrativos: em 2021, a plataforma repassou US$ 10 bilhões a seus criadores. Apesar de ter se popularizado com conteúdo adulto, o canal hoje reúne criadores de todos os tipos, de culinária a atividades físicas, que cobram para que seus assinantes tenham acesso aos conteúdos. Com os novos rumos da internet, que aponta para conteúdos mais nichados para os usuários e mais monetizáveis para os criadores, plataformas como essas permitirão a gestão de comunidades mais personalizadas, mais próximas do que cada grupo busca.
Herman Narula também falou sobre o potencial das comunidades para a próxima fase da internet. Para o CEO da Improbable, um dos caminhos passa por deixar aproximar os fãs de seus ídolos, oferecendo experiências que seriam impossíveis no mundo físico, fortalecendo esses grupos que se organizam entre si e se autogovernam, mas sem regras totalmente descentralizadas.
O futuro da inteligência ambiental
O futuro reserva novas formas de inteligência ambiental – mas isso não quer dizer que os dispositivos de voz, como a Alexa, ficarão de fora. Pelo contrário: de acordo com Rohit Prasad, cientista-chefe da equipe responsável pela assistente de voz da Amazon, esses dispositivos devem se tornar cada vez mais inteligentes e, na mesma medida, mais invisíveis. A ideia é que essa tecnologia se desenvolva no sentido de estabelecer um vínculo de intimidade com os humanos, se tornando, no futuro, mais do que um assistente, mas uma companhia.
Noam Chomsky e as críticas à IA
O painel que fechou o último dia de eventos foi pura provocação. Aos 94 anos, o filósofo Noam Chomsky teceu críticas importantes sobre o papel e o futuro da inteligência artificial no mundo. Em sua fala, o linguista lembrou que acompanhou, em 1950, os primeiros estudos sobre inteligência artificial feitos por Alan Turing, matemático que influenciou seu trabalho. Segundo Chomsky, o objetivo inicial desses estudos era entender como as capacidades técnicas e intelectuais desenvolvidas na área de ciência da computação poderiam ajudar a entender como os humanos pensam, mas, hoje, “isso é considerado fora de moda”, dando espaço a uma diversão com brinquedos caros.
“A Inteligência artificial virou uma diversão com brinquedos caros”.
Ao lado de Chomsky no painel, o cientista Gary Marcus reforçou a visão do filósofo. “Estamos indo no caminho errado em inteligência artificial. O certo envolve olhar para os humanos e fazer ciência. O que temos é algo que parece bom, mas não é tão profundo quanto a gente precisa”, destacou. O tempo e energia que essas ferramentas demandam de seus usuários também apareceram nas discussões dos estudiosos. Para Marcus, a ilusão de que a IA, como usada hoje, acaba tirando o foco de atividades que poderiam contribuir para o entendimento de questões mais profundas sobre a humanidade, sobre como ela se relaciona com as linguagens e o mundo em si.
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