Lançamento da Apple em 2023 retoma discussões sobre o futuro dos dispositivos vestíveis e a proteção da mente

Em 2022, um relatório da Strategy Analytics estimava que o mercado global do metaverso atingiria 42 bilhões de dólares até 2026, com base na perspectiva do lançamento de um dispositivo de realidade aumentada no segundo semestre de 2022, que seria um momento crucial para o metaverso.

Em 2023, com o lançamento dos óculos de realidade mista da Apple e da Meta (Vision Pro e o Meta Quest 3, respectivamente), o que chama a atenção é que nenhuma das big techs mencionou o termo “metaverso” em suas divulgações. Os dispositivos estão sendo apontados como os protagonistas da era pós-smartphone e prometem moldar o futuro das experiências imersivas — o que, até o ano passado, era a premissa do que seria esse universo digital.

Metaverso ou não, essas tecnologias traçam novas linhas

O Vision Pro pode ser considerado, brevemente, como uma neurotecnologia, abrindo um novo capítulo na interação humano-máquina. A capacidade do Vision Pro de inferir respostas emocionais e cognitivas do usuário através de imagens e sons e adaptar a interface do usuário em tempo real é uma inovação impressionante e que pode, a partir de um uso massificado, nos levantar questões sobre privacidade e ética.

Embora a Apple tenha afirmado que não terá acesso a dados sobre o olhar do usuário em aplicativos, essa nova fronteira tecnológica levanta questões fundamentais sobre a transparência, o consentimento e o controle dos dados.

Além do Vision Pro, recentemente a Apple registrou uma patente para a linha AirPods, dando a entender que poderia ler ondas cerebrais e sugerindo uma abordagem ousada para a integração de tecnologias de saúde e bem-estar em dispositivos comuns. Equipados com eletrodos capazes de medir diversos biosinais, incluindo eletroencefalografia (EEG), eletromiografia (EMG), eletrooculografia (EOG), entre outros, os AirPods poderiam transformar-se em ferramentas médicas pessoais.

Contudo, essa convergência de tecnologia e saúde não só promete avanços significativos em cuidados médicos personalizados, mas também desafia nossa compreensão de privacidade e segurança. À medida que essas tecnologias começam a influenciar nossas decisões e percepções, torna-se fundamental que haja regulamentação e supervisão adequadas para garantir que não sejam abusadas de maneira que possam comprometer nossa liberdade cognitiva ou privacidade pessoal.

No Chile, outra neurotecnologia já deu o que falar

Pioneiro em incluir a proteção da mente entre seus direitos fundamentais, o Chile protagonizou nova decisão inédita no último mês, envolvendo o uso de dados coletados pelo dispositivo de monitoramento de atividade cerebral Insight Brainwear, da empresa de biotecnologia americana Emotiv. O aparelho, criado para pesquisas a partir da eletroencefalografia e que tem expandido seus usos, é um dispositivo avançado de interação entre computador e cérebro (Brain Machine Interface/BMI) e consegue rastrear o desempenho cognitivo, monitorar emoções e controlar objetos físicos e virtuais a partir de aprendizado de máquina.

Na decisão, o Supremo Tribunal acolheu o recurso de proteção e ordenou ao Instituto de Saúde Pública e à Direção das Alfândegas que adotassem as medidas necessárias para que a comercialização, a utilização do dispositivo e  o tratamento dos dados por ele recolhidos cumpram rigorosamente a legislação nacional. Para os magistrados, o armazenamento de dados de atividade cerebral realizado pelo vestível da Emotiv afeta o direito à integridade física e mental de seus usuários, razão pela qual ordenou a exclusão de todas as informações do recorrente.

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