“Agir de tal maneira que os efeitos de tua ação não sejam destruidores da futura possibilidade de vida humana” – Hans Jonas
A preocupação ao redor da ética tem levantado uma série de questões a partir dos novos contextos trazidos pelas tecnologias emergentes. Já estamos cientes, a cada dia que passa, que novos guias éticos precisam ser desenvolvidos para ampliar nossa perspectiva de convívio social e sobre como uma sociedade pode coexistir com as agências não-humanas.
O Século XXI impõe uma problematização filosófica sobre o modo de viver moral e social dos humanos que estão em simbiose com as tecnologias. As áreas cinzentas serão cada vez maiores e suas tênues linhas entre a discussão do que é bom ou ruim para uma sociedade precisa estar abraçado por guias éticos que se insiram nesse novo contexto social.
A ética, por sua vez, está sempre inserida em contextos. É por meio dela que refletimos sobre aquilo que é essencial ao sentido da vida humana, na qual interagem algoritmos, sensores, big data, animais, vírus e todo o planeta. O sentido da ética, portanto, deve ir além daquele aplicado à sociedade a partir de seu conceito clássico. Sendo assim, precisamos recolocar perguntas fundamentais em nosso contexto de sobrevivência: o que é o bom viver? O que é uma boa sociedade? Como colocar a tecnologia a favor dos humanos, do meio ambiente e dos seres vivos?
A tecnologia, de tempos em tempos, transforma radicalmente a maneira como vivemos. Porém chegamos num momento em que precisamos estar mais conscientes sobre as ações por ela produzidas e de suas consequências, antes que danos possam ser causados de maneira estrutural em nossa sociedade.
Tecnologias fazem parte da sobrevivência do humano e precisamos empregá-las da melhor maneira para promover valores que integram a sociedade, sociedade essa interpretada a partir de um conceito muito mais amplo do que aquele que conhecemos atualmente.
Portanto, é preciso construir perguntas e desenvolver propostas sobre guias éticos que renovem o habitat do ser humano que atua em simbiose com tecnologias e que vive em conjunto com as demais espécies e com o planeta.
De fato, vivemos em um período histórico que apresenta inúmeros desafios globais de alta complexidade, os quais exigem soluções que adotem estratégias de governança colaborativa e sustentável. No entanto, a crença partilhada por muitos de que a inovação e as novas tecnologias podem resolver quase todos esses desafios é não apenas ingênua, como perigosa.
O avanço exponencial da tecnologia impõe dilemas éticos muitas vezes ignorados na concepção e ao longo do desenvolvimento de produtos e serviços. É fato, porém, que empresas que tenham compromisso com a geração de impactos sociais positivos precisam estar atentas à forma como conduzem suas atividades, de modo a mitigar riscos.
Analisar o design ético e os riscos sobre o uso de determinada tecnologia ainda não faz parte do nosso cotidiano. Hans Jonas trata a técnica como um exercício de poder humano, ou seja, como uma “forma de ação”, sujeita à avaliação moral e ética. A tecnologia, de acordo com sua visão, teve seu poder aumentado de forma contundente de modo que a ética está despreparada para enfrentá-lo. Não percebemos a dimensão de nossas escolhas e notadamente precisamos trazer nosso olhar para o desenvolvimento ético em novas tecnologias.
A busca pela ética no desenvolvimento de tecnologias emergentes deve ser a garantia e a confiança de que os riscos sejam apenas decisões estratégicas em prol de inovações necessárias, mas que jamais irão comprometer o bem-estar de usuários, partes interessadas e da sociedade em geral.
Portanto, trazer a ética para o centro de discussões em inovações tecnológicas não é e nem jamais será um elemento bloqueador de ideias inovadoras e sim um guia para que estas possam trazer a resolução de problemas a partir de uma observação sobre riscos calculados e devidamente mitigados.
No fundo, a visão da ética, seja em tecnologia ou fora dela, deve sempre estar atrelada ao nosso bem viver – na visão dos filósofos gregos – da vida que vale a pena ser vivida, em melhores hábitos planetários e em processos de conexão.
A prioridade de uma nova lucidez ética precisa assumir o centro do debate, a fim de que novos guias éticos possam dirigir o avanço das tecnologias emergentes em prol do bem-estar da humanidade e não contra ela.
Referências
CUPANI, Alberto. Filosofia da Tecnologia: Um convite. Florianópolis: Editoria UFSC, 2017.
OLIVEIRA, Jelson. Três pilares para a filosofia da tecnologia. Filosofia da Tecnologia, Caxias do Sul: Educs, 2020.
Compartilhe
Compartilhe
posts relacionados
13/03/2023
Neurodireitos: a necessária proteção da mente humana em tempos de avanço de neurotecnologias e da IA
Imagine uma escola primária na qual as crianças usam fones de ouvido com…
08/03/2023
Newsverso apresenta sua primeira colunista; Sílvia Piva é advogada e entusiasta do metaverso
A partir desta quarta-feira (8) o Newsverso vai contar com uma parceira mais do…
22/01/2023
De olho no futuro, Silvia Piva prepara profissionais da área jurídica
Como aplicar o Direito ao metaverso? De que forma as novas tecnologias vão…